Saúde Psíquica: Caso Isabella
Por Melissa de Fátima Antunes
18/07/2008
Após a tragédia ocorrida recentemente aqui em São Paulo - Capital toda a
população ficou muito abalada devido à tamanha crueldade envolvida na morte da
pequena Isabella.
Nossos anjinhos estão acostumados com pais e mães, geralmente responsáveis,
zelosos e rígidos. Mas como as crianças hoje em dia têm acesso a mídia (falada e
escrita), ficaram assustadas ao saberem que os indiciados eram: o próprio pai
(Alexandre Nardoni) e a madrasta (Ana Carolina Jatobá).
Muitas crianças ficaram apreensivas por que se colocaram no lugar da pequena
Isabella, somando à comoção da própria sociedade, os comentários que por ventura
ouviram em casa, escola e entre os amigos.
Vamos imaginar como fica a cabecinha dos nossos anjinhos: “nossa coitada da
Isabella, se o pai dela, que alega inocência foi preso”. Ou “nossa, se o pai
dela a jogou o que pode vir acontecer comigo que não sou muito comportado(a)”?
A insegurança e o medo tomaram conta das crianças, por contaminação da
indignação dos adultos. Como sabemos, as crianças precisam de limites, muitas
vezes devem fazer coisas que não lhe agradam e ouvem dos que zelam pelo seu bem
estar: querida (o) faça isso, me obedeça, isso é para o seu próprio bem!
A imaginação delas corre solta, imaginado que o pai da Isabella provavelmente
também tenha dito algo semelhante. Pois devemos lembrar que as crianças avaliam
o mundo que a cerca através da sua própria realidade, pois ainda não compreendem
o conceito mais abstrato de que cada um tem uma vida, e cada vida possui uma
realidade que deve ser compreendida e respeitada.
A infância é a época onde o egocentrismo é permitido, e considerado como uma
defesa do ego para com o mundo externo, que começa a se apresentar como algo
novo e assustador.
Segundo CABRAL & NICK (1997) o conceito de um ser egocêntrico como categoria de
predicamento, “... indivíduos que só percebem a palavra em função de como ela os
afeta. Conseqüentemente são menos capazes de chegar a uma avaliação objetiva, ou
social ou normal das pessoas ou acontecimentos, nas circunstâncias de suas
vidas.”
Consideramos que uma criança avalia os fatos de acordo com sua própria
realidade, algo normal e esperado, porém se esta criança tem seus 30/40 anos
existe algo a ser revisto. Por que tanta falta de comprometimento?
De acordo com WINNICOTT podemos considerá-los como adultos com ego fragilizado,
e este problema pode ser evitado de acordo com a influência do meio ambiente na
vida deste que, antes de ser uma criança de 30/40 anos teve seus 7/8 anos onde
se enquadrava nos moldes considerados “normais”. A dependência da criança para
conhecer este novo mundo depende dos seus cuidadores (pais e responsáveis) e
como estes lidam com o meio ambiente, se sua influência é positiva ou não.
Caso não haja tranqüilidade do adulto em lidar com o meio ambiente e este
demonstra para a criança, isso afetará a estrutura psíquica em formação
(construção do superego). Devemos sempre tomar cuidado, pois o mundo é algo
assustador como um monstro invencível (contos de fadas).
Por isso quando o adulto teme o universo que lhe cerca e acredita que deve
poupar sua amada criança impedindo que ela saiba a verdade ou o que de fato
ocorreu com a Isabela, virá a colocá-la contra as regras e limites impostos.
Mas o fato ocorreu, todos lêem, falam e assistem como se estivessem acompanhando
uma novela, para saber o que ocorreu ou vai acontecer com a família Nardoni.
Nada mais justo do que favorecer o crescimento psíquico da criança e permitir
que ela tenha contato com a verdade, para que ela não viva alienada e comece
desde cedo a compreender que existe vida inteligente além dos muros da sua casa.
Ou seja, vocês (pais e responsáveis ou educadores) não devem esconder e/ou
omitir o que anda freqüentemente sendo motivo de notícia e estardalhaço, pois
sua criança deve saber que vivemos numa sociedade onde existem pessoas de boa e
de má índole. Que podemos julgar apenas pela convivência e sempre nos
preservando ao máximo.
Sei que parece ameaçador permitir que seu filho (a) saiba desde pequeno que no
mundo existem pessoas com bom ou mau caráter. Mas por que não usarmos desta
terrível tragédia para conversarmos com nossos anjinhos sobre o bem e o mal?
Devemos buscar o discernimento e quando conseguimos diferenciar um do outro
denominamos este fato de sabedoria.
Dica: falar sempre a verdade numa linguagem acessível para seu anjinho.
Dialoguem com seus amados anjinhos. Mas lembrem-se viver não é tão simples, por
isso eles devem ter seus dilemas próprios e suas dúvidas. Colaborem!!!
Bibliografia:
CABRAL & NICK(A. & E.); Dicionário técnico de psicologia, SP, Ed. Cultrix, 1997.
DIAS, E. O; A teoria do amadurecimento de D.W. Winnicott, RJ, Ed.Imago, 2203.
WWW.estadao.com.br
Melissa de Fatima Antunes tem como área de pesquisa e atuação o atendimento
psicoterapêutico de crianças, adolescentes, adultos, orientação de pais e a
terceira idade. É editora de um blog onde fornece material de leitura para os
pais, responsáveis e educadores em geral: http://afadadodia.blogspot.com/
É pesquisadora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo - USP,
pelo Laboratório APOIAR.