Do que se trata o perdão?
Por Sirley Bittú
14/07/2003
Ao se falar em perdão, é comum nos remetermos quase de imediato a
uma leitura religiosa, ou seja, o perdão sendo visto como
unilateral, entendido como algo que doamos a alguém, um ato de
desprendimento, generosidade e bondade com o outro, mas é mais do
que isso...
Quando estamos magoados e feridos, os sentimentos mais presentes são
a tristeza, a decepção e a raiva. Neste momento é difícil se pensar
em perdão. Primeiramente há o momento de viver a própria dor,
senti-la para depois resolve-la. Muitos tentam pular essa fase
inevitável e como conseqüência apenas prorrogam seu próprio
sofrimento.
A raiva é o mais primário dos sentimentos, pois é gerada pela
frustração e pelo sentimento de impotência. Dela nasce o desejo de
vingança como uma tentativa de diminuir a própria dor, mas a
vingança é um sentimento traiçoeiro, pois se alia a seu adversário
no momento em que sua vida passa a ser apenas um instrumento com o
objetivo de atingir ou prejudicar aquele que lhe feriu. Facilmente a
vingança torna-se seu senhor e você seu escravo. Trata-se de um
ciclo vicioso e aparentemente sem fim.
Também não podemos esquecer que algumas pessoas são muito mais
susceptíveis a mágoas e melindres que outras, possuem limiares
diferentes, variando de acordo com sua personalidade, capacidade de
percepção, capacidade de tolerar frustrações, entendimento de mundo,
sensibilidade, ou seja, de acordo com sua saúde emocional. Uma mesma
vivência é sentida , percebida e compreendida de forma diferente até
mesmo entre irmãos, que supostamente foram criados sob as mesmas
variáveis, o que dirá entre pessoas que possuem crivos diferentes.
Desde o nascimento, somos seres carentes de relacionamentos, o ser
humano precisa se relacionar para se desenvolver emocionalmente. A
família é o berço do desenvolvimento emocional, costumo dizer que é
nosso útero social, pois é através dela que recebemos essa carga de
crenças, entendimentos e leituras sobre o mundo. Nossas relações
passam pelo crivo dessas crenças, pela forma de entender o mundo que
nos cerca e de nos perceber enquanto pessoas, nossos direitos e
responsabilidades.
Estamos sempre construindo e reconstruindo nossas idéias, num ciclo
dinâmico, que pode ser saudável ou não. É claro que essas crenças
trazem todos os preconceitos e dificuldades relacionais de nossos
ancestrais, afinal ninguém pode dar aquilo que não tem.
Cabe a nós em nossa jornada acessar nossas fontes de saúde que são
nossa criatividade e espontaneidade. Elas nos ajudarão a tentar o
novo, a perdoar,a reconstruir, a olhar de outra forma a mesma
questão, e a nos fortalecer, nos impulsionando para novos movimentos
e experiências.
Relacionar-se é fácil quando encontramos pessoas que pensam e
percebem o mundo como nós, ou seja se utilizam do mesmo fóco para
avaliar os acontecimentos, mas a grande questão é quando nos
deparamos com pessoas que possuem outros parâmetros e valores, neste
caso, para que a relação seja possível, é necessária uma carga a
mais de respeito ao outro a suas idéias e a seu ponto de vista e
obviamente de respeito pessoal.
Num processo psicoterapêutico nossa leitura é feita a partir de um
entendimento relacional, como sabemos, toda ação gera uma reação.
Quando tomamos consciência de nossa parcela de responsabilidade
naquilo que nos acomete, temos a possibilidade de nos tornarmos
senhores de nossas vidas, mais autênticos e não mais escravos, cegos
e perdidos diante dos acontecimentos. Não nos tornamos vítimas nem
tão pouco vilões, apenas humanos conscientes dos reflexos de nossas
atitudes. A raiva não é negada ou sublimada ela é canalizada para
movimentos positivos que podem trazer crescimento e desenvolvimento
pessoal, ela é transformada em energia positiva provedora de mudança
e transformação.
ENTÃO O QUE É PERDOAR? Perdoar é realmente um ato de amor mas, não
apenas amor ao outro, mas também ,amor a si próprio. É assumir a
responsabilidade sobre os próprios atos e desejos, é perceber-se na
dimensão do humano e como tal entender a sua significância. Perdoar
é amadurecer emocionalmente é aprender que somos falíveis e
imperfeitos, tal qual o outro com quem nos relacionamos e essa é a
genialidade do ser humano. Não existem os certos e os errados,
existe o olhar a partir de um ponto de vista e cada um tem o seu,
portanto não existe A verdade, existem verdades á partir de
realidades diferentes. O parâmetro é o respeito, o sentimento de
cidadania, a ética e o amor.
Psicodramatista Didata Supervisora
Terapeuta em EMDR pelo EMDR Institute/EUA
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