Delinquência
Por Dr. Wagner Paulon
20/12/1999
Há mais de 2.000 anos, um sacerdote egípcio gravou numa pedra:
"Nossa Terra está degenerada. Os filhos já não obedecem aos pais". A
delinqüência não constitui problema novo. Hoje em dia, ela incluiu
não só as transgressões mais sérias, como arrombamento, assalto e
roubo, como também "violações do status" — atos como inobservância
da hora de recolher (nos E.U.A.), gazeio de aulas, fuga ao lar,
atividade sexual, ou "incorrigibilidade", que não constituiriam
violações da lei se fossem cometidas por adultos.
Não obstante, os atuais índices de delinqüência são causa de séria
preocupação em muitos países ocidentais, inclusive nos Estados
Unidos, onde a incidência dos atos delinqüentes relatados tem
aumentado rapidamente desde 1960, com um aumento ainda mais nítido
no índice de transgressões sérias e de delinqüência feminina.
Qual a causa da delinqüência?
A delinqüência é tanto um problema psicológico como sociológico. A
incidência é maior nas áreas socialmente muito desorganizadas e
economicamente carentes, como os guetos urbanos das grandes cidades.
Em tais ambientes, a delinqüência costuma ser uma tradição aprovada,
e as gangs de delinqüentes são comuns. Não obstante, muitos jovens
oriundos desses ambientes não se tornam delinqüentes — e,
inversamente, um número cada vez maior de jovens originários de
áreas suburbanas ricas estão começando a se envolver em atos
delinqüentes.
Que é que distingue o jovem que se torna delinqüente daquele que não
se torna, mesmo quando os dois são oriundos do mesmo meio?
As pesquisas indicam haver diferenças gerais de personalidade entre
o delinqüente médio e o não-delinqüente. Os primeiros tendem a ser
mais agressivos e desafiadores, suspeitosos da autoridade,
ressentidos, impulsivos e dotados de pouco autocontrole. Eles também
parecem ter menos auto-estima e maior número de sentimentos de
inadequação pessoal e de rejeição social e emocional. Apesar de sua
freqüente postura de desafio, sob a superfície tais adolescentes
tendem a ter péssima opinião sobre si mesmos.
Relacionamento entre país e filhos no mundo dos delinqüentes
Embora obviamente a influência das pressões do grupo de companheiros
e de um ambiente social geralmente adverso desempenhem um papel na
delinqüência, a influência dos pais parece ser decisiva. As
pesquisas, com nítida regularidade, têm indicado que "as técnicas
disciplinares a que os delinqüentes têm sido submetidos tendem mais
a ser frouxas, vagas ou ultra-restritivas, e a envolver castigos
físicos, do que a envolver a explicação do que seja comportamento
inadequado para a criança". Entre os delinqüentes, o relacionamento
entre pais e filhos tende a caracterizar-se pela hostilidade mútua,
pela falta de coesão familiar e por rejeição, indiferença, discórdia
ou apatia por parte dos pais.
Os pais dos delinqüentes tendem a ser considerados por observadores
independentes como cruéis, negligentes e inclinados a ridicularizar
os próprios filhos (especialmente os meninos). É muito difícil serem
descritos como calorosos ou afetuosos. Por outro lado, seus filhos
delinqüentes, sobretudo do sexo masculino, tendem a ter poucas
ligações com o próprio pai e a considerá-lo modelo de comportamento
totalmente inaceitável. Suas mães costumam ser descritas como
descuidadas dos filhos ou como sendo inadequadas nessa função, além
de hostis ou indiferentes, mais do que amorosas e responsáveis.
Muitos delinqüentes também provêm de lares desfeitos.
Que podem fazer os pais?
Em primeiro lugar, os pais precisam manter o problema em
perspectiva. O comportamento delinqüente nunca deve ser ignorado;
mas muitos jovens que se envolvem em atos delinqüentes de menor
vulto, tornam-se adultos perfeitamente responsáveis e normais.
Entrar num cinema sem pagar, apropriar-se da propriedade de um
colega, cabular aulas e mesmo furtar pequenos artigos de lojas não
são "crimes" comparáveis a arrombamento e roubo.
As discussões sérias e honestas entre pais e filhos, conduzidas numa
atmosfera calma mas realista, podem, em geral, ser de muita ajuda,
especialmente se o relacionamento entre eles se basear na confiança,
no afeto e no respeito mútuos. Quando tal comunicação não for
possível, quando parecer que alguma perturbação emocional está
desempenhando papel importante no comportamento delinqüente, ou
quando a transgressão for muito séria, convém buscar assistência
profissional.
Como assinalamos no Capítulo 4, os pais competentes — que cuidam
genuinamente dos filhos e os encorajam a desenvolver independência e
confiança própria, mas que também estabelecem claros padrões de
comportamento adequado e responsável — são menos passíveis de ter um
filho ou filha delinqüente do que os pais autoritários,
rejeitadores, ultra-indulgentes ou negligentes.
Dr. Wagner Paulon - Formação em psicanálise (Escola Paulista),
mestre em psicopatologia (Escola Paulista), psicologia (Saint
Meinrad College) USA, pedagogia (FEC ABC), MBA (University Abet)
USA, curso de especialização em entorpecentes (USP), psicanalista
por muitos anos de vários hospitais de São Paulo.